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sexta-feira, 22 de abril de 2011

Lágrimas de Pasolini *

Sexualidade liberada é  o que mais vemos atualmente. Liberada,  o que não quer dizer liberta e libertária.
Bate forte em mim o Pasolini. Assassinado não por ser liberado e sim  por ser  libertário.


Imagens de El Caso Pasolini, de Gianluca Maconi**

Mais de 35 anos se passaram desse brutal acontecimento  - que se repetiu e se repete, infelizmente,  tantas vezes contra a vida de pessoas, quase sempre com motivações homofóbicas ou ginofóbicas . De lá para cá, a coisa só piorou. A coisa ou o "algo"  que o próprio Pasolini foi incansável combatente: " o desejo ansioso e conformista transformou os jovens em pobres eretomaníacos neuróticos, eternamente insatisfeitos (precisamente porque sua liberdade sexual não foi conquistada, mas oferecida) e, portanto, infelizes.".

E não são só os jovens que padecem dessa neurose.  Bebendo uma única e preciosa cerveja num buteco, fui agredida por um sujeito também de cabelos brancos, daqueles  que se consideram o exemplo vivo de modernidade e liberalidade. Depois de receber um não  ao seu nojento assédio em que tentou me submeter ao seu poder fálico (e falido!), me agrediu duramente. Disse aos brados coisas do tipo "uma velha como você não pode escolher". Mais uma vez escolhi: saí do buteco e nele não volto mais. Era o único lugar em que me sentia a vontade para tomar uma cerveja sem precisar de acompanhante. Não existe mais esse lugar. Vou ter que inventar outro.

Tenho vivido diversas experiências desse tipo. Há quem diga (os moralizantes dos outros): "também, frequentando butecos..., só pode dar nisso". Mas eu digo,  como disse tantas vezes Pasolini: essas maldições acabam sendo verdadeiras bençãos pois elas alimentam em mim uma outra racionalidade não moralista, aquela que não descarta a paixão e a irracionalidade mas é incansável no combate aos irracionalismos anarquicos, desesperados e infelizes. Como  Pasolini, essa resistência não vem sem algumas lágrimas. "Lágrimas de nostalgia e de cólera". Nostalgia da elegância libertária. Cólera contra a  modernidade liberada, porém não liberta e não libertária, muitas vezes parafascista.

* Texto redigido como comentário no blog do amigo Jorge Bichuetti, aqui com pequenas modificações.
** Fonte:  O Grito .
As citações entre aspas são palavras Pasolini, extraídas do artigo: Pasolini: paixão e ideologia, de Michel Lahud, publicado em Os sentidos da paixão, Funarte/Cia. das Letras, 1987.  

Um comentário:

  1. Marta, a sexualidade liberada e não libertária, é simulação da liberdade; perversa dissimulação, pois, enreda a todos numa malha de violência como um aparente ar de livre existir falso.
    Rebelemo-nos é exijamos liberdade, liberade...
    Abraços insurgentes e ternos, Jorge

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